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Foto do escritorDiogo Braga Crônicas

A LINGUAGEM UNIVERSAL DA FELICIDADE (Crônica n° 07)

Atualizado: 19 de mai. de 2021

Meu pai e minha mãe sempre viajaram e sempre que podiam levavam eu e minha irmã juntos, contando que com isto nos pudéssemos colecionar lembranças de lugares diferentes do nosso cotidiano. E colecionamos.


Com a gasolina mais barata do que é hoje, quase sempre viajávamos de carro sacodindo nos buracos das estradas deste Brasil que eram, na época, mais precárias. Mas meus pais tiveram o privilégio de nos levar algumas vezes para o estrangeiro, ocasião em que eu tentava fazer meu inglês precário ser útil, mas meu pai fazia questão de mostrar que ele era fluente na linguagem dos sinais e se gabava que com a sua desenvoltura já tinha rodado o mundo e nunca havia passado um “perrengue”, mesmo só sabendo falar português. Mentira dele.


De fato, ele se virava, mas certamente as custas de muitas gargalhadas de quem o acompanhava. No restaurante ele não se contentava em pedir um café apontando pro menu, ele queria se conectar com a pessoa, fazer uma brincadeirinha e lhe roubar um sorriso e quase sempre conseguia, posto que se há uma linguagem universal é a da felicidade e nesta ele era fluente.


Mas isto gerou, é claro, muitos constrangimentos que também viraram boas memórias. Eu posso dizer também que outra faceta desta linguagem universal é a dança. A dança é a manifestação última da alegria. Não existe manifestação física melhor ou maior que represente tão bem esse sentimento.


Eu poderia dizer que os estágios físicos da alegria se iniciam no sorriso, podem passar pela gargalhada, mas que definitivamente terminam na dancinha. Não há, por exemplo, dança da derrota, só há dancinha da vitória. A tristeza é estática, introvertida, a alegria é movimento, expansiva, não consegue se conter em sí mesma e precisa ser compartilhada. Eu diria que para ser completa ela DEVE ser compartilhada.


E eu dancei em muitas ocasiões com o meu pai, mas quase sempre em festas, momentos de pré-determinados que sabíamos que iríamos dançar. Mas teve em uma viagem que a dança não foi premeditada, foi fruto do acaso, um presente da natureza. Era 2012, meu pai tinha 62 anos, estávamos em Nova York e tínhamos acabado de passar uma vergonha com meu pai tentando pedir café fazendo os seus gestos malucos. Saímos e continuamos nosso passeio pela pelas ruas enevoadas da Lower Manhattan, apreciando os edifícios idosos em tijolos vermelhos ao lado de torres metálicas jovens que sumiam nas nuvens.


Com copos de café cheios, curtíamos um calor reconfortante nas mãos quando meu pai sorriu, esticou um dos braços pra frente e disse: “Acho que está nevando”. Não demorou 5 minutos e começou uma nevasca que nos fez procurar um abrigo em uma galeria comercial, mas quando estavam todos seguros, ele virou pra mim e falou: “vamos lá de novo”?


Embora meu pai já tivesse viajado muito, nunca tinha presenciado neve caindo do céu e é raro fazer algo pela primeira vez na vida aos 62 anos. Eu também nunca tinha tido esta oportunidade. Então, deixamos as mochilas e todas as sacolas que carregávamos com minha mãe e corremos pra nevasca deixando a segurança da cobertura.


E com a neve caindo no nosso rosto, molhando as nossas roupas, o sorriso brotou no rosto, primeiro estágio da felicidade, e tudo o que conseguimos fazer pelos minutos seguintes foi dançar. Arrancamos risos e sorrisos dos que passavam e viam dois loucos inebriados de alegria.


Foi uma dança ridícula que brotou do acaso, dançávamos como dois patos querendo ciscar como galinhas. Dançamos com os braços pro céu agradecendo a oportunidade, dançamos pra aquecer o corpo, porque estava frio, mas foi mais que isso, foi a extrapolação máxima de felicidade compartilhada.


Era neve, mas poderia ter sido chuva, poderia ter sido uma poça de lama, papel ou purpurina de carnaval. Foi uma dança que aqueceu o coração e que carrego como lembrança até hoje. Foi o exercício da linguagem universal da felicidade.

02/10/2019 (Crônica n° 07)

Diogo Braga Crônicas



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